“Se lembrarmos como todos os homens são aproximadamente iguais em força física, e mesmo em poder e capacidade mental, antes de cultivados pela educação, teremos necessariamente de admitir que só o consentimento de cada um poderia, ao princípio, levá-Ios a se associarem e submeterem a qualquer autoridade. O povo, se remontarmos à primitiva origem do governo nas florestas e nos desertos, é a fonte de todo e qualquer poder e jurisdição; voluntariamente, para bem da paz e da ordem, os homens renunciaram à sua liberdade natural e acataram leis ditadas pelos seus iguais e companheiros. As condições sob as quais se dispuseram à submissão ou foram expressas, ou eram tão claras e óbvias que se podia perfeitamente considerar inútil exprimi-las. Ora, se é isto que se entende por contrato original, é inegável que todo o governo assenta, de início, num contrato, e que as mais antigas e toscas associações humanas se constituíram essencialmente em virtude desse princípio. Seria inútil perguntar em que registos consta essa carta das nossas liberdades: não foi escrita em pergaminho, nem em folhas ou cascas de árvores; precedeu o uso da escrita e de todas as outras artes civilizadas da vida. Mas descobrimo-la claramente na natureza do homem, na igualdade, ou algo semelhante à igualdade, que verificamos existir entre todos os indivíduos dessa espécie.[…]
Mas aqueles filósofos (…) [n]ão se limitam a afirmar que o governo, na sua primitiva infância, teve origem no consentimento, ou antes, na aquiescência voluntária do povo; afirmam além disso que, mesmo anualmente, agora que chegou à maturidade plena, ele continua a ter esse único fundamento. Afirmam que todos os homens continuam a nascer iguais e não devem fidelidade a qualquer príncipe ou governo, caso não estejam presos pela obrigação e sanção de uma promessa. E como nenhum homem iria renunciar, sem em troca receber alguma coisa equivalente, às vantagens da sua liberdade natural, submetendo-se à vontade de outro homem, essa promessa deve sempre ser entendida como condicional, sem lhe impor obrigação alguma, a não ser que receba justiça e protecção do seu soberano. O soberano, em troca, promete-lhe estas vantagens e, se acaso deixar de cumprir a promessa, terá violado, pelo seu lado, as cláusulas do compromisso, libertando assim o seu súbdito de qualquer obrigação de fidelidade. Tal é, segundo esses filósofos, o fundamento da autoridade de todo e qualquer governo; e tal é o direito de resistência que pertence a todo e qualquer súbdito.
Mas, se os que assim argumentam passeassem o seu olhar pelo mundo inteiro, nada encontrariam que tivesse a menor relação com as suas ideias, ou pudesse justificar sistema tão apurado e filosófico. Pelo contrário, em toda a parte encontramos príncipes que consideram os seus súbditos como sua propriedade, e afirmam o seu direito independente à soberania, baseado na conquista ou na sucessão. Encontramos também, em toda a parte, súbditos que reconhecem ao seu príncipe esse direito, considerando-se nascidos já submetidos à obrigação de obediência ao seu soberano, do mesmo modo que nasceram já submetidos à obrigação de respeito e obediência aos seus pais.
[…]
A obediência ou sujeição torna-se coisa tão habitual que os homens, na sua maioria, jamais procuram investigar as suas origens ou causas, tal como em relação à lei da gravidade, à resistência ou às leis mais universais da natureza. Ou então, se alguma vez sentem essa curiosidade, logo que ficam a saber que eles próprios e os seus antepassados têm estado sujeitos, desde há várias épocas ou desde tempos imemoriais, a certa forma de governo ou a certa família, imediatamente concordam, reconhecendo a sua obrigação de fidelidade. […]
Mas diz-se que esse contrato em que o governo assenta é o contrato original, e portanto deve ser considerado demasiado antigo para poder ser conhecido pela geração actual. Se com isto se quer referir o acordo mediante o qual selvagens pela primeira vez se associaram e conjugaram as suas forças, ele deve ser reconhecido como real; mas sendo tão antigo, e estando já obliterado por mil mudanças de governo e de príncipe, não é lícito supor-se que conserve ainda qualquer autoridade. Se alguma coisa devemos dizer a tal respeito, é forçoso afirmar que qualquer governo, que seja legítimo e ao qual os súbditos tenham o dever de prestar fidelidade, assentava inicialmente no consentimento e num pacto voluntário. Mas isto, além de implicar o consentimento, por parte dos pais, em vincular os seus filhos, mesmo até às gerações mais remotas (coisa que os autores republicanos jamais admitirão), além disso, dizia eu, tal facto não é justificado pela história ou pela experiência, em qualquer época ou em qualquer país do mundo.
Quase todos os governos actualmente existentes, ou dos quais algo ficou registado na história, assentaram inicialmente na usurpação ou na conquista, ou em ambas, sem qualquer pretensão de legítimo consentimento ou sujeição voluntária do povo. Quando à frente de um exército ou de um partido se encontra um homem experimentado e audacioso, frequentemente se lhe torna fácil, empregando umas vezes a violência e outras vezes falsas pretensões, impor o seu domínio a um povo cem vezes mais numeroso do que os seus partidários. Impede a liberdade de comunicações, para que os seus inimigos não possam saber com segurança o seu número ou força; não lhes concede lazer para se reunirem num corpo que lhe seja contrário; é até possível que todos aqueles que são instrumentos da sua usurpação desejem a sua queda; mas a ignorância em que se encontram das intenções uns dos outros conserva-os amedrontados, e é a única causa da segurança do chefe. Foi mediante tais artifícios que muitos governos foram fundados, e a isto se resume todo o contrato original de que se podem vangloriar.
(…) Será possível descobrir, em todas estas ocorrências, algo mais do que força e violência? Onde está o acordo mútuo, a associação voluntária de que tanto se fala?
[…]
É inútil dizer que todos os governos são ou devem ser criados com base no consentimento popular, na medida em que a necessidade das coisas humanas o permitir. Isto é totalmente favorável à ideia que defendo. Afirmo que jamais as coisas humanas permitirão tal consentimento, e raramente algo que aparente sê-Io; e que a conquista ou a usurpação, ou mais simplesmente a força, mediante a dissolução dos antigos governos, é a origem de quase todos os novos governos que o mundo viu nascer. E que, nos poucos casos em que possa parecer ter havido um consentimento, este foi geralmente tão irregular, tão limitado ou tão misturado com a fraude e a violência, que não se lhe pode atribuir grande autoridade.
Não tenho aqui a intenção de negar que o consentimento do povo, quando ocorre, seja um justo fundamento do governo; é sem dúvida o melhor e o mais sagrado de todos. Afirmo apenas que muito raramente ele se verificou, em qualquer grau, e quase nunca em toda a sua plenitude, e que é portanto forçoso admitir também algum outro fundamento do governo.
[…]
Se se objectar que, pelo facto de continuar a viver sob o domínio de um príncipe que seria possível abandonar, cada indivíduo manifesta um consentimento tácito à sua autoridade e lhe promete obediência, poderá responder-se que tal consentimento implícito só pode ter lugar se cada indivíduo pensar que o caso depende da sua escolha. Mas, se cada um pensar (como sucede com todos os homens que nasceram sob um governo estabelecido) que tem desde a nascença deveres de submissão para com um certo príncipe ou uma certa forma de governo, será absurdo inferir um consentimento ou escolha que, neste caso, todos expressamente negam e repudiam.
Será lícito afirmar seriamente que um pobre camponês ou artífice tem a possibilidade de livremente abandonar o seu país, quando não conhece as línguas nem os costumes estrangeiros, e vive apenas o seu dia-a-dia com o pequeno salário que ganha? Seria o mesmo que dizer que um homem, devido ao facto de permanecer num navio, dá o seu livre consentimento à autoridade do capitão, embora tenha sido levado para bordo enquanto dormia, e só lançando-se ao mar e morrendo possa sair desse navio.
E se o príncipe proíbe os súbditos de abandonar os seus domínios, como no tempo de Tibério, quando um cavaleiro romano foi considerado criminoso por ter tentado fugir para a pátria, a fim de escapar à tirania daquele imperador? Ou como quando os antigos moscovitas castigavam toda e qualquer viagem com a pena de morte? E, se acaso um príncipe verificasse que grande número dos seus súbditos era atacado por uma fúria de emigração para o estrangeiro, sem dúvida alguma disso os impediria, e com grande razão e justiça, para evitar o despo- voamento do seu reino. Perderia ele o direito à fidelidade de todos os seus súbditos em virtude dessa lei tão sensata e razoável? E neste caso não há dúvida de que os súbditos são privados da sua liberdade de escolha.
Um grupo de homens que abandonasse o seu país natal para ir povoar qualquer região desabitada poderia sonhar com a recuperação da sua liberdade natural; mas depressa viria a descobrir que o seu príncipe continuava a reivindicá-los como seus súbditos, apesar de se encontrarem numa nova colónia. E com esta atitude estaria apenas a agir em conformidade com as ideias mais comuns dos homens.
O exemplo mais autêntico que se pode verificar de um consentimento tácito deste tipo é o do estrangeiro que se instala em qualquer país, conhecendo previamente o príncipe, o governo e as leis a que se irá submeter. Mesmo assim, embora seja mais voluntária, a sua fidelidade é muito menos esperada e exigida do que a de um súbdito nascido no país; pelo contrário, o seu príncipe natural continua a reivindicá-lo. E, se acaso não castiga o renegado, se o captura quando em guerra a serviço do seu novo príncipe, essa clemência não assenta na lei nacional, a qual em todos os países condena o prisioneiro, e sim no consentimento dos príncipes, que combinaram entre si esta indulgência, a fim de evitar represálias.
Se uma geração de homens se retirasse de cena de uma vez só, e lhe sucedesse uma outra, como acontece no caso dos bichos-da-seda e das borboletas, a nova raça, se fosse suficientemente sensata para escolher os seus governantes, coisa que sem dúvida nunca acontece entre os homens, poderia estabelecer voluntariamente e mediante o consentimento geral a sua própria forma de constituição, sem de modo algum levar em conta as leis ou precedentes que dominavam no tempo dos seus antepassados. Mas a sociedade humana está em fluxo permanente, a cada momento há um homem que se retira do mundo e outro que nele entra, e assim torna-se necessário, a fim de preservar a estabilidade do governo, que os membros da nova geração aceitem a constituição estabelecida, seguindo de perto o caminho traçado pelos seus pais, os quais por sua vez fizeram o mesmo, seguindo as pisadas dos seus pais. […]”
Hume, David (2002). Ensaios Morais, Políticos e Literários. Lisboa: Imprensa Nacional Casa da Moeda, pp. 400-16 (Adaptado por Vítor João Oliveira).
Mas aqueles filósofos (…) [n]ão se limitam a afirmar que o governo, na sua primitiva infância, teve origem no consentimento, ou antes, na aquiescência voluntária do povo; afirmam além disso que, mesmo anualmente, agora que chegou à maturidade plena, ele continua a ter esse único fundamento. Afirmam que todos os homens continuam a nascer iguais e não devem fidelidade a qualquer príncipe ou governo, caso não estejam presos pela obrigação e sanção de uma promessa. E como nenhum homem iria renunciar, sem em troca receber alguma coisa equivalente, às vantagens da sua liberdade natural, submetendo-se à vontade de outro homem, essa promessa deve sempre ser entendida como condicional, sem lhe impor obrigação alguma, a não ser que receba justiça e protecção do seu soberano. O soberano, em troca, promete-lhe estas vantagens e, se acaso deixar de cumprir a promessa, terá violado, pelo seu lado, as cláusulas do compromisso, libertando assim o seu súbdito de qualquer obrigação de fidelidade. Tal é, segundo esses filósofos, o fundamento da autoridade de todo e qualquer governo; e tal é o direito de resistência que pertence a todo e qualquer súbdito.
Mas, se os que assim argumentam passeassem o seu olhar pelo mundo inteiro, nada encontrariam que tivesse a menor relação com as suas ideias, ou pudesse justificar sistema tão apurado e filosófico. Pelo contrário, em toda a parte encontramos príncipes que consideram os seus súbditos como sua propriedade, e afirmam o seu direito independente à soberania, baseado na conquista ou na sucessão. Encontramos também, em toda a parte, súbditos que reconhecem ao seu príncipe esse direito, considerando-se nascidos já submetidos à obrigação de obediência ao seu soberano, do mesmo modo que nasceram já submetidos à obrigação de respeito e obediência aos seus pais.
[…]
A obediência ou sujeição torna-se coisa tão habitual que os homens, na sua maioria, jamais procuram investigar as suas origens ou causas, tal como em relação à lei da gravidade, à resistência ou às leis mais universais da natureza. Ou então, se alguma vez sentem essa curiosidade, logo que ficam a saber que eles próprios e os seus antepassados têm estado sujeitos, desde há várias épocas ou desde tempos imemoriais, a certa forma de governo ou a certa família, imediatamente concordam, reconhecendo a sua obrigação de fidelidade. […]
Mas diz-se que esse contrato em que o governo assenta é o contrato original, e portanto deve ser considerado demasiado antigo para poder ser conhecido pela geração actual. Se com isto se quer referir o acordo mediante o qual selvagens pela primeira vez se associaram e conjugaram as suas forças, ele deve ser reconhecido como real; mas sendo tão antigo, e estando já obliterado por mil mudanças de governo e de príncipe, não é lícito supor-se que conserve ainda qualquer autoridade. Se alguma coisa devemos dizer a tal respeito, é forçoso afirmar que qualquer governo, que seja legítimo e ao qual os súbditos tenham o dever de prestar fidelidade, assentava inicialmente no consentimento e num pacto voluntário. Mas isto, além de implicar o consentimento, por parte dos pais, em vincular os seus filhos, mesmo até às gerações mais remotas (coisa que os autores republicanos jamais admitirão), além disso, dizia eu, tal facto não é justificado pela história ou pela experiência, em qualquer época ou em qualquer país do mundo.
Quase todos os governos actualmente existentes, ou dos quais algo ficou registado na história, assentaram inicialmente na usurpação ou na conquista, ou em ambas, sem qualquer pretensão de legítimo consentimento ou sujeição voluntária do povo. Quando à frente de um exército ou de um partido se encontra um homem experimentado e audacioso, frequentemente se lhe torna fácil, empregando umas vezes a violência e outras vezes falsas pretensões, impor o seu domínio a um povo cem vezes mais numeroso do que os seus partidários. Impede a liberdade de comunicações, para que os seus inimigos não possam saber com segurança o seu número ou força; não lhes concede lazer para se reunirem num corpo que lhe seja contrário; é até possível que todos aqueles que são instrumentos da sua usurpação desejem a sua queda; mas a ignorância em que se encontram das intenções uns dos outros conserva-os amedrontados, e é a única causa da segurança do chefe. Foi mediante tais artifícios que muitos governos foram fundados, e a isto se resume todo o contrato original de que se podem vangloriar.
(…) Será possível descobrir, em todas estas ocorrências, algo mais do que força e violência? Onde está o acordo mútuo, a associação voluntária de que tanto se fala?
[…]
É inútil dizer que todos os governos são ou devem ser criados com base no consentimento popular, na medida em que a necessidade das coisas humanas o permitir. Isto é totalmente favorável à ideia que defendo. Afirmo que jamais as coisas humanas permitirão tal consentimento, e raramente algo que aparente sê-Io; e que a conquista ou a usurpação, ou mais simplesmente a força, mediante a dissolução dos antigos governos, é a origem de quase todos os novos governos que o mundo viu nascer. E que, nos poucos casos em que possa parecer ter havido um consentimento, este foi geralmente tão irregular, tão limitado ou tão misturado com a fraude e a violência, que não se lhe pode atribuir grande autoridade.
Não tenho aqui a intenção de negar que o consentimento do povo, quando ocorre, seja um justo fundamento do governo; é sem dúvida o melhor e o mais sagrado de todos. Afirmo apenas que muito raramente ele se verificou, em qualquer grau, e quase nunca em toda a sua plenitude, e que é portanto forçoso admitir também algum outro fundamento do governo.
[…]
Se se objectar que, pelo facto de continuar a viver sob o domínio de um príncipe que seria possível abandonar, cada indivíduo manifesta um consentimento tácito à sua autoridade e lhe promete obediência, poderá responder-se que tal consentimento implícito só pode ter lugar se cada indivíduo pensar que o caso depende da sua escolha. Mas, se cada um pensar (como sucede com todos os homens que nasceram sob um governo estabelecido) que tem desde a nascença deveres de submissão para com um certo príncipe ou uma certa forma de governo, será absurdo inferir um consentimento ou escolha que, neste caso, todos expressamente negam e repudiam.
Será lícito afirmar seriamente que um pobre camponês ou artífice tem a possibilidade de livremente abandonar o seu país, quando não conhece as línguas nem os costumes estrangeiros, e vive apenas o seu dia-a-dia com o pequeno salário que ganha? Seria o mesmo que dizer que um homem, devido ao facto de permanecer num navio, dá o seu livre consentimento à autoridade do capitão, embora tenha sido levado para bordo enquanto dormia, e só lançando-se ao mar e morrendo possa sair desse navio.
E se o príncipe proíbe os súbditos de abandonar os seus domínios, como no tempo de Tibério, quando um cavaleiro romano foi considerado criminoso por ter tentado fugir para a pátria, a fim de escapar à tirania daquele imperador? Ou como quando os antigos moscovitas castigavam toda e qualquer viagem com a pena de morte? E, se acaso um príncipe verificasse que grande número dos seus súbditos era atacado por uma fúria de emigração para o estrangeiro, sem dúvida alguma disso os impediria, e com grande razão e justiça, para evitar o despo- voamento do seu reino. Perderia ele o direito à fidelidade de todos os seus súbditos em virtude dessa lei tão sensata e razoável? E neste caso não há dúvida de que os súbditos são privados da sua liberdade de escolha.
Um grupo de homens que abandonasse o seu país natal para ir povoar qualquer região desabitada poderia sonhar com a recuperação da sua liberdade natural; mas depressa viria a descobrir que o seu príncipe continuava a reivindicá-los como seus súbditos, apesar de se encontrarem numa nova colónia. E com esta atitude estaria apenas a agir em conformidade com as ideias mais comuns dos homens.
O exemplo mais autêntico que se pode verificar de um consentimento tácito deste tipo é o do estrangeiro que se instala em qualquer país, conhecendo previamente o príncipe, o governo e as leis a que se irá submeter. Mesmo assim, embora seja mais voluntária, a sua fidelidade é muito menos esperada e exigida do que a de um súbdito nascido no país; pelo contrário, o seu príncipe natural continua a reivindicá-lo. E, se acaso não castiga o renegado, se o captura quando em guerra a serviço do seu novo príncipe, essa clemência não assenta na lei nacional, a qual em todos os países condena o prisioneiro, e sim no consentimento dos príncipes, que combinaram entre si esta indulgência, a fim de evitar represálias.
Se uma geração de homens se retirasse de cena de uma vez só, e lhe sucedesse uma outra, como acontece no caso dos bichos-da-seda e das borboletas, a nova raça, se fosse suficientemente sensata para escolher os seus governantes, coisa que sem dúvida nunca acontece entre os homens, poderia estabelecer voluntariamente e mediante o consentimento geral a sua própria forma de constituição, sem de modo algum levar em conta as leis ou precedentes que dominavam no tempo dos seus antepassados. Mas a sociedade humana está em fluxo permanente, a cada momento há um homem que se retira do mundo e outro que nele entra, e assim torna-se necessário, a fim de preservar a estabilidade do governo, que os membros da nova geração aceitem a constituição estabelecida, seguindo de perto o caminho traçado pelos seus pais, os quais por sua vez fizeram o mesmo, seguindo as pisadas dos seus pais. […]”
Hume, David (2002). Ensaios Morais, Políticos e Literários. Lisboa: Imprensa Nacional Casa da Moeda, pp. 400-16 (Adaptado por Vítor João Oliveira).
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