«Terrorismo e Direitos Humanos
Pode dizer-se com segurança que a crença de que todos os seres humanos possuem um direito (igual) à vida, pelo menos no sentido mínimo de um direito negativo à vida – o direito de não ser morto de forma injusta e incorrecta - é defendido por quem acredita na existência de direitos humanos. Também podemos encontrar essa ideia na Declaração Universal dos Direitos Humanos das Nações Unidas. Assim, o artigo 3º afirma que, entre outras coisas, “todos têm direito à vida.” A importância de reconhecermos um tal direito humano universal é evidente: a protecção da vida humana é a condição sine qua non da capacidade do indivíduo alcançar qualquer coisa e tudo – qualquer e todos os valores – que um ser humano é capaz de alcançar na sua relação consigo próprio e com os outros. Mas mesmo que alguém não o reconheça como um direito humano claro, um direito à vida em si, acredito que estamos obrigados a reconhecer a existência de algumas normas protectoras, como outros direitos humanos e/ou princípios da equidade e da justiça, que proíbam tirar a vida humana, a menos que se verifiquem circunstâncias bastante excepcionais. Por exemplo, a justiça proíbe a execução de pessoas inocentes por um crime que não tenha cometido. Ou a protecção moral da vida humana pode ser protegida, por exemplo, pelo direito humano de ser tratado como uma pessoa moral e não como um “objecto”.
As circunstâncias excepcionais que tenho em mente são aquelas em que o direito à vida é suplantado por pretensões morais e axiológicas mais fortes. Podem incluir a protecção da igualdade de direitos dos outros, nomeadamente o direito dos outros à vida (como no caso dos soldados mandados para a guerra pelo seu país, para defender a vida e a liberdade dos seus concidadãos contra nações agressoras); ou situações em que um certo acto é (1) o menor de dois males e (2) não viole quaisquer outros direitos humanos ou morais equivalentes, ou o princípio da equidade e da justiça. Por exemplo, em certos tipos de eutanásia passiva ou activa, ou no suicídio assistido, como no caso dos doentes terminais que sofrem de um dor física insuportável (condição [1]) e no caso da eutanásia ou do suicídio assistido em que o doente realiza o desejo sincero de morrer (condição [2]). Excepto nestes casos ou em casos similares, a morte deliberada ou conhecida de pessoas inocentes é moralmente errada.
Defendi noutro lugar[1] que devemos reconhecer o direito humano fundamental de todos os indivíduos a serem tratados como pessoas morais. Mais, que esse direito inclui um direito igual de todos serem livres para satisfazer as suas necessidades e interesses, e para actualizar os seus potenciais: isto é, para procurar por si próprios o seu bem-estar.[2] Para além disso, defendi que todos os seres humanos possuem um direito de igualdade de tratamento e oportunidades, para os auxiliar a realizar os valores antes mencionados, como parte ou como consequência do seu direito a serem tratados como pessoas morais.
Um direito humano à vida universal e negativo,[3] e por consequência um direito à segurança e a integridade física e mental, se for reconhecido,[4] pode ser facilmente derivado do direito de igualdade de tratamento e oportunidades, como uma condição da própria possibilidade do exercício desse ou de qualquer outro direito moral, legal, ou outro tipo de direitos, incluindo o direito a ser tratado como pessoa moral como um todo. O direito de igualdade de tratamento e oportunidades será vazio ou inconsequente na prática e até na teoria, se a segurança de alguém não for protegida. Com efeito, consideradas as três principais causas da discórdia na natureza humana segundo Thomas Hobbes – a competição, a “desconfiança” ou desejo de segurança, e o desejo de glória na ausência de uma norma protectora do direito humano à vida e à sua protecção legal, a existência humana rapidamente se tornaria um exemplo de um estado de natureza hobbesiano.
Não haveria “nem artes, nem letras; nem sociedade; e o que é pior do que tudo, um constante temor e perigo de morte violenta; e a vida do homem seria solitária, pobre, sórdida, selvagem e curta.”[5] É evidente que se assumirmos um direito negativo à vida, a morte das vítimas imediatas dos terroristas - a menos que satisfaçam as condições (1) e (2) antes referidas – serão sempre moralmente erradas. Na realidade, a condição (1) poderá algumas vezes ser satisfeita, mas a condição (2) nunca o poderá ser. De facto, todos os tipos e formas de terrorismo que distingui anteriormente, violam seriamente os direitos humanos das vítimas imediatas e dos vitimizados enquanto pessoas morais.
Tratar as pessoas como pessoas morais significa tratá-las com respeito segundo duas formas afins. Primeiro, significa respeitar a sua autonomia enquanto indivíduos com os seus próprios desejos e interesses, planos e projectos, compromissos e objectivos. E essa autonomia é claramente violada se forem humilhados, coagidos ou aterrorizados, tornados reféns ou raptados, mas sobretudo se forem mortos. Segundo, o respeito envolve “um certo conjunto de atitudes e de formas de as manifestar, reagir, pensar e sentir relativamente” às pessoas.[6] Inclui sensibilidade e respeito pelos seus sentimentos e desejos, aspirações, projectos e objectivos. O que é, por sua vez, uma parte integrante do tratamento da sua vida como um todo – incluindo as suas interacções e memórias – enquanto algo a valorizar. Finalmente, inclui respeitar “a sua cultura ou etnia, religião ou identidade racial ou herança.”[7] Estas coisas são a própria antítese daquilo que os terroristas fazem às suas vítimas imediatas e aos vitimizados.
Pode dizer-se com segurança que a crença de que todos os seres humanos possuem um direito (igual) à vida, pelo menos no sentido mínimo de um direito negativo à vida – o direito de não ser morto de forma injusta e incorrecta - é defendido por quem acredita na existência de direitos humanos. Também podemos encontrar essa ideia na Declaração Universal dos Direitos Humanos das Nações Unidas. Assim, o artigo 3º afirma que, entre outras coisas, “todos têm direito à vida.” A importância de reconhecermos um tal direito humano universal é evidente: a protecção da vida humana é a condição sine qua non da capacidade do indivíduo alcançar qualquer coisa e tudo – qualquer e todos os valores – que um ser humano é capaz de alcançar na sua relação consigo próprio e com os outros. Mas mesmo que alguém não o reconheça como um direito humano claro, um direito à vida em si, acredito que estamos obrigados a reconhecer a existência de algumas normas protectoras, como outros direitos humanos e/ou princípios da equidade e da justiça, que proíbam tirar a vida humana, a menos que se verifiquem circunstâncias bastante excepcionais. Por exemplo, a justiça proíbe a execução de pessoas inocentes por um crime que não tenha cometido. Ou a protecção moral da vida humana pode ser protegida, por exemplo, pelo direito humano de ser tratado como uma pessoa moral e não como um “objecto”.
As circunstâncias excepcionais que tenho em mente são aquelas em que o direito à vida é suplantado por pretensões morais e axiológicas mais fortes. Podem incluir a protecção da igualdade de direitos dos outros, nomeadamente o direito dos outros à vida (como no caso dos soldados mandados para a guerra pelo seu país, para defender a vida e a liberdade dos seus concidadãos contra nações agressoras); ou situações em que um certo acto é (1) o menor de dois males e (2) não viole quaisquer outros direitos humanos ou morais equivalentes, ou o princípio da equidade e da justiça. Por exemplo, em certos tipos de eutanásia passiva ou activa, ou no suicídio assistido, como no caso dos doentes terminais que sofrem de um dor física insuportável (condição [1]) e no caso da eutanásia ou do suicídio assistido em que o doente realiza o desejo sincero de morrer (condição [2]). Excepto nestes casos ou em casos similares, a morte deliberada ou conhecida de pessoas inocentes é moralmente errada.
Defendi noutro lugar[1] que devemos reconhecer o direito humano fundamental de todos os indivíduos a serem tratados como pessoas morais. Mais, que esse direito inclui um direito igual de todos serem livres para satisfazer as suas necessidades e interesses, e para actualizar os seus potenciais: isto é, para procurar por si próprios o seu bem-estar.[2] Para além disso, defendi que todos os seres humanos possuem um direito de igualdade de tratamento e oportunidades, para os auxiliar a realizar os valores antes mencionados, como parte ou como consequência do seu direito a serem tratados como pessoas morais.
Um direito humano à vida universal e negativo,[3] e por consequência um direito à segurança e a integridade física e mental, se for reconhecido,[4] pode ser facilmente derivado do direito de igualdade de tratamento e oportunidades, como uma condição da própria possibilidade do exercício desse ou de qualquer outro direito moral, legal, ou outro tipo de direitos, incluindo o direito a ser tratado como pessoa moral como um todo. O direito de igualdade de tratamento e oportunidades será vazio ou inconsequente na prática e até na teoria, se a segurança de alguém não for protegida. Com efeito, consideradas as três principais causas da discórdia na natureza humana segundo Thomas Hobbes – a competição, a “desconfiança” ou desejo de segurança, e o desejo de glória na ausência de uma norma protectora do direito humano à vida e à sua protecção legal, a existência humana rapidamente se tornaria um exemplo de um estado de natureza hobbesiano.
Não haveria “nem artes, nem letras; nem sociedade; e o que é pior do que tudo, um constante temor e perigo de morte violenta; e a vida do homem seria solitária, pobre, sórdida, selvagem e curta.”[5] É evidente que se assumirmos um direito negativo à vida, a morte das vítimas imediatas dos terroristas - a menos que satisfaçam as condições (1) e (2) antes referidas – serão sempre moralmente erradas. Na realidade, a condição (1) poderá algumas vezes ser satisfeita, mas a condição (2) nunca o poderá ser. De facto, todos os tipos e formas de terrorismo que distingui anteriormente, violam seriamente os direitos humanos das vítimas imediatas e dos vitimizados enquanto pessoas morais.
Tratar as pessoas como pessoas morais significa tratá-las com respeito segundo duas formas afins. Primeiro, significa respeitar a sua autonomia enquanto indivíduos com os seus próprios desejos e interesses, planos e projectos, compromissos e objectivos. E essa autonomia é claramente violada se forem humilhados, coagidos ou aterrorizados, tornados reféns ou raptados, mas sobretudo se forem mortos. Segundo, o respeito envolve “um certo conjunto de atitudes e de formas de as manifestar, reagir, pensar e sentir relativamente” às pessoas.[6] Inclui sensibilidade e respeito pelos seus sentimentos e desejos, aspirações, projectos e objectivos. O que é, por sua vez, uma parte integrante do tratamento da sua vida como um todo – incluindo as suas interacções e memórias – enquanto algo a valorizar. Finalmente, inclui respeitar “a sua cultura ou etnia, religião ou identidade racial ou herança.”[7] Estas coisas são a própria antítese daquilo que os terroristas fazem às suas vítimas imediatas e aos vitimizados.
[1] Haig Khatchadourian, “Toward a Foundation for Human Rights”, Man and World, 18 (1985): 219-240, e “The Human Right to be Treated as a Person”, Journal of Value Inquiry, 19 (1985): 183-195.
[2] Khatachadourian, “The Human Right”, passim.
[3] Distinto do direito positivo à vida, que inclui – sobretudo e antes de mais o direito de não ser fisicamente ameaçado ou morto – um direito a um bem-estar mínimo.
[4] Um tal direito pode também ser derivado do primeiro e do segundo princípios de John Rawls em Theory of Justice (Cambridge, MA, 1971). Com efeito, o direito de igualdade de oportunidades é parte do seu primeiro princípio.
[5] Thomas Hobbes, “Self.interest”, in Great Traditions in Ethics, 5th., Ethel M. Albert e tal., eds. (Belmont, CA, 1984), 134. Reimpresso de Leviathan. Devo acrescentar que o próprio Hobbes encarava a auto-preservação como a primeira lei da natureza (humana), e que o seu contrato social tem como objectivo, inter alia, a segurança.
[6] Khatachadourian, “The Human Right”, 192.
[7] Ibid..
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