quarta-feira, 6 de fevereiro de 2008

Argumentos ad hominem

"O recurso à argumentação ad hominem é, por vezes, tão poderoso e persuasivo que o seu uso tem como principal desvantagem acabar com qualquer troca de ideias ou com toda forma de argumentação objectiva e racional. Como afirma D. N. Walton, “o perigo é que o emprego excessivo de ataques pessoais pode resultar numa mudança dialéctica, baixando o nível da discussão critica para o da altercação pessoal, com resultados desastrosos para a lógica da argumentação” (D. N. Walton, 2006: p. 188).
Há diferentes tipos de argumento ad hominem. Consideremos o argumento ad hominem abusivo. Neste tipo de argumento pode criticar-se o carácter, as acções passadas ou as afiliações do argumentador, tais como alianças politicas, crenças religiosas ou a sua etnia. O ataque pessoal é dirigido contra a ética do argumentador, sugerindo que ele não é digno de confiança, não é uma pessoa íntegra ou que é desonesto. Há casos em que é posta em dúvida a sua capacidade de argumentar racionalmente, podendo mesmo ser sugerido que o argumentador é louco ou mentalmente desequilibrado e que, por conseguinte, o seu argumento não merece atenção ou respeito. O argumento ad hominem abusivo é sempre uma falácia.
Considere-se, a título de exemplo, o caso do julgamento de um assassinato, em que o advogado de acusação chamou a depor uma testemunha que afirma ter visto um alegado homicídio. O advogado de defesa perguntou o seguinte: “Sendo que o senhor é um conhecido toxicodependente, não é possível que estivesse sob a influência de drogas quando alegadamente presenciou o homicídio?”. Ora, isto é um exemplo de argumento ad hominem abusivo. Porquê? Porque é colocada em causa a credibilidade da testemunha, já que é matéria de facto que algumas drogas causam alucinações e se a testemunha estivesse de facto sob a influência de drogas no momento do homicídio, é possível que na realidade não tivesse visto o que afirmava ter visto.
O argumento ad hominem circunstancial contra a pessoa é baseado na alegação de que as circunstâncias da pessoa são incoerentes com a posição que defende na argumentação. Diz D. N. Walton que esta forma de ataque “é extremamente eficaz no debate político porque sugere que a pessoa atacada não segue, na própria conduta, os princípios que defende para os outros. Ou seja, quem não pratica o que prega não é uma pessoa digna de atenção e não poder ser levada a sério” (D. N. Walton, 2006: p.197).
Considere-se, a título de exemplo, o que Paulo Portas disse ao primeiro-ministro José Sócrates numa critica ao actual governo. Afirmou “Sr Primeiro-ministro, prometeu que iria baixar os impostos, mas a única coisa que fez até agora foi aumentá-los”. José Sócrates, em resposta a isto, afirmou que o anterior governo, de que Paulo Portas fazia parte como ministro, tinha prometido a mesma coisa, mas também não a tinha cumprido aquando da sua estada no governo. Este exemplo mostra não apenas o uso do ad hominem circunstancial, mas o maior perigo da argumentação ad hominem, a saber, a utilização de outro ad hominem como réplica – o que se designa de tu quoque – e que pode acabar com qualquer troca de ideias.
No ataque à imparcialidade do argumentador (ad hominem “poço envenenado”) é posta em causa a confiança e credibilidade do argumentador em questão relativamente a um determinado assunto, nomeadamente através da acusação de ser tendencioso por deter algum interesse, preconceito ou motivo oculto para apoiar, e com isso favorecer, um dos lados da discussão e contestar o outro. Por exemplo, num julgamento, um réu é acusado de burlas, branqueamento de capitais e outros crimes financeiros. O seu advogado de defesa sabe que o seu cliente é sócio maioritário de uma empresa. Ao investigar a empresa descobre que o nome do juiz do caso aparece como sendo portador de um elevado número de acções e tentativas de se tornar accionista maioritário dessa empresa e apresenta em tribunal um documento que prova que o juiz está de facto ligado à empresa e que, por isso, deve ser afastado do julgamento, por haver a possibilidade de o juiz ser parcial na sua decisão final, podendo beneficiar ou prejudicar o réu em seu favor. Note-se que neste caso o argumento apresentado não é uma falácia, pois o tema em discussão é pertinente e, a ser válido, poderia conferir alguma parcialidade à decisão do juiz.
Há circunstâncias em que as provas externas não são suficientes para sustentar uma dada tese. Quando isso acontece, um bom argumento ad hominem pode ser suficiente para que o ónus da prova oscile de um lado da discussão para o outro. Ora, para distinguir um bom argumento ad hominem de uma falácia ad hominem estabeleceram-se alguns critérios que podem demonstrar incoerência por parte do orador. Por exemplo, mostrar concessões ou comprometimentos do orador, explicitar posições internas ou pôr em questão a sua imparcialidade, sinceridade ou a credibilidade pode ser altamente eficaz num diálogo racional."

Bibliografia
Walton, Douglas N. (2006). Lógica Informal. São Paulo: Martins Fontes, pp. 187-239


Trabalho realizado no âmbito da disciplina de Filosofia pelo Ruben e pelo Daniel do 11º C (ano lectivo 2007/08)

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