segunda-feira, 7 de abril de 2008

Michael Tooley, "Estatuto Moral e Clonagem Humana" (Parte III)

«Indivíduos mais felizes e saudáveis
Um terceiro benefício da clonagem é o facto de que permitiria aumentar a probabilidade da pessoa a que estamos a dar existência gozar de maior felicidade e saúde. Pois, na medida em que a constituição genética de um indivíduo se relaciona com a esperança da sua vida, ou com as suas doenças, tanto físicas como mentais, ou com os traços de personalidade e temperamento relevantes para a felicidade ou infelicidade, ao clonar uma pessoa que viveu uma vida longa, ou que se manteve intelectualmente desperta, e que não sofreu da doença de Alzheimer, que não sofreu de cancro, artrite, ataques cardíacos, pressão arterial elevada, etc., e que não exibiu tendências para a depressão, ou esquizofrenia, etc., está-se a aumentar as probabilidades do indivíduo que está a ser produzido gozar de mais saúde e de viver uma vida mais feliz.

Uma educação de crianças mais gratificante: indivíduos com traços desejáveis
Bastantes casais prefeririam criar crianças com determinados traços. Em alguns casos, poderiam querer crianças com uma dada aparência física. Noutros casos, poderiam gostar de crianças que possuíssem capacidades físicas para que pudessem ser mais bem sucedidas na realização de actividades físicas mais exigentes. Ou poderiam preferir crianças que tivessem capacidades intelectuais que lhes permitissem apreciar matemática e ciência. Ou poderiam preferir crianças que possuíssem traços que lhes permitissem envolver em diversas actividades cujos objectivos fossem estéticos. Alguns dos traços que as pessoas poderiam desejar para os seus filhos, possuem presumivelmente uma forte base hereditária; outros há que uma criança, dado um conjunto relevante de genes, dado o ambiente correcto, provavelmente adquiriria. Na medida em que os traços em questão caíssem em qualquer outra dessas categorias, a produção de uma criança através da clonagem, permitiria que mais casais tivessem filhos com traços que eles considerassem desejáveis.

Uma educação de crianças mais gratificante: usando o auto-conhecimento
Há uma segunda forma através da qual a clonagem torna a criação de crianças mais gratificante, e encontramo-la se recuarmos à nossa infância. A maioria das pessoas, quando faz isso, lembra coisas que considera boas e outras que teriam sido melhores se as circunstâncias fossem diferentes. Claro que em alguns casos a nossa avaliação pode não ser correcta e algumas das coisas que os nossos pais fizeram e outras que deixaram de fazer, podem efectivamente ter tido efeitos positivos no nosso desenvolvimento. Todavia, tudo considerado, parece plausível que a maioria das pessoas avalie de forma correcta quais os aspectos da sua educação que tiveram efeitos positivos e quais é que não tiveram.
Então, a ideia é a de que um casal que cria um filho que é um clone de um dos pais, o conhecimento que o pai relevante possuirá do modo como o deve educar, adequa-se melhor à psicologia da criança. Para além disso, dada a maior similitude psicológica que existirá neste caso entre um dos pais e a criança, o pai relevante será mais capaz, a dada altura, de avaliar como se passam as coisas do ponto de vista da criança. Parece, por isso, que há boas probabilidades desse casal achar a educação da criança uma experiência mais recompensadora, e da criança ter uma infância mais feliz já que será melhor compreendida.

Infertilidade
Desde o êxito da clonagem da Dolly, que pelo menos uma pessoa expressou a intenção de levar por diante a ideia de usar a clonagem para ajudar casais inférteis. Devido a razões que apareceram na secção “Clonagem no contexto presente”, a ideia de que a clonagem deve ser usada num futuro próximo parece moralmente problemática. Todavia, em princípio, a ideia geral pode conter um mérito considerável. Por exemplo, como Dan Brock e outros disseram, uma vantagem é que “a clonagem permitirá às mulheres que não ovulam e aos homens que não produzem espermatozóides produzir uma descendência que lhes seja biologicamente aparentada”
[1]. Outra vantagem, como também adiantou Brock, é que “os embriões podem ser clonados, tanto por transferência do núcleo como por divisão do embrião, com vista a aumentar o número de embriões para implantação e dessa forma aumentar as probabilidades de uma concepção bem sucedida”[2].

Crianças para Casais Homossexuais
Bastantes pessoas, especialmente nos Estados Unidos, acreditam que a homossexualidade é profundamente errada e que os homossexuais não devem ser autorizados a casar ou a criar filhos. Todavia, acredito que estas opiniões seriam rejeitadas pela maioria dos filósofos, que, pelo contrário, passariam a defender que a homossexualidade não é moralmente errada, e que os homossexuais deviam ser autorizados a casar e a terem filhos. Assuma-se, para bem da presente discussão, que estas perspectivas estão correctas. Então, como Philip Kitcher e outros afirmaram, a clonagem parece ser um método promissor para garantir aos casais homossexuais crianças que possam educar, uma vez que, no caso de um casal homossexual, cada criança poderia ser um clone de uma pessoa; no caso de um casal lésbico, qualquer criança seria, neste sentido, biologicamente ligada a ambas as pessoas:

Um casal de lésbicas deseja uma criança. Uma vez que gostariam que a criança estivesse biologicamente ligada a uma delas, solicitavam que uma célula nuclear de uma fosse introduzida no óvulo da outra, e que o embrião fosse implantado no útero da mulher que tivesse doado o óvulo.
[3]

Clonar para salvar pessoas
Uma possibilidade final foi sugerida pelo conhecidíssimo caso dos pais de Ayala, na Califórnia, que decidiram ter um outro filho com a esperança, a posteriori justificada, de que a criança resultante estaria em condições de doar um pedaço de medula óssea para uma operação de transplante que permitiria salvar a vida da sua filha adolescente, que sofria de leucemia. Se a clonagem fosse possível na altura, os pais teriam à disposição um curso de acção alternativa, em vez de ter um filho pela forma normal, com probabilidade de não ser compatível: se pudessem ter clonado a filha doente, a compatibilidade da medula óssea estaria assegurada.»

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[1] Brock, D., na secção “A clonagem humana seria um meio novo resolver a infertilidade que algumas pessoas vivem agora”.
[2] Ibid..
[3] Kitcher, P. (1998). Whose self is it , anyway? The Sciences 37, 58-62. Deve notar-se que, embora Kitcher considere inicialmente esta ideia atraente, acaba por concluir que é problemática, consideradas as razões que apresentarei na subsecção “A clonagem de seres humanos para produzir pessoas”.

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