«Não podemos esperar que a prática da cidadania cresça só porque os políticos e os pensadores políticos assim o desejam ou exortam as populações para a alcançar. Não é, como mais uma vez a tradição do republicanismo cívico procura deixar claro, uma prática natural dos seres humanos, nem uma actividade que espontaneamente escolham. Os seres humanos “naturais”, “não-cívicos” ou “pré-cívicos”, têm que ser moldados para desempenharem o seu papel de cidadãos. É esta a tarefa da educação em sentido amplo. Mas a educação tem que ser apoiada e reforçada por um conjunto predominante de costumes e práticas dirigidas para a manutenção de um ideal cívico. Isso pode implicar uma religião civil ou a profissão de uma fé na comunidade. A prática da cidadania implica que, ao contrário do que acontece no mundo moderno, uma porção bastante mais substancial da nossa vida seja vivida publicamente. Não significa que não tenhamos uma vida privada; significa simplesmente que ser cidadão implica ser politicamente activo e que a actividade política acontece no domínio público.
É igualmente importante distinguir entre os laços que ligam os cidadãos uns aos outros e o altruísmo. Existe seguramente em muitas pessoas um reservatório de altruísmo que as leva a dar sangue, a participar em causas meritórias, ou a despender tempo, esforço e dinheiro em organizações de apoio aos mais desfavorecidos. Mas cidadania não é altruísmo: é o reconhecimento dos objectivos da comunidade como os nossos próprios objectivos, é participação na escolha destes e é o empenhamento na sua realização. O altruísmo é a resposta que um ser humano dá a outro. A cidadania é exclusiva: não é à humanidade de uma pessoa que se responde, mas ao facto de que ele ou ela é concidadão ou estrangeiro. Ao escolher uma identidade para nós, passamos a reconhecer quem pertence e quem não pertence à nossa comunidade política, mas também a reconhece aqueles que são inimigos potenciais. A cidadania corta com formas de universalismo religioso ou secular e envolve o reconhecimento, sempre que for necessário, daquilo que consideramos prioritário para a nossa comunidade política. Isto não implica a assunção de uma postura agressiva relativamente aos estrangeiros. Significa apenas que ser cidadão nem sempre implica tratar os outros como seres humanos. Mais uma vez, esta é uma ideia que reside no próprio coração da tradição do republicanismo cívico.
[…]
Não encontro palavra mais apropriada do que amizade para caracterizar as relações que devem existir entre os indivíduos para que uma comunidade possa funcionar. […] É a amizade, mais do que, por exemplo, a “virtude cívica” ou a “civilidade”, que se deve procurar para alcançar o que se pode chamar de comunidade, uma vez que é este tipo de laço entre os indivíduos que a cria. […] É a amizade que moraliza as acções dos indivíduos autónomos e que cria os cidadãos.
[…]
A sobrevivência de uma comunidade depende tanto da sua capacidade para se proteger, como da educação e do treino do mais novos. Os cidadãos têm deveres e responsabilidades nestas áreas, que passam a ser o próprio objecto do juízo político. Mais, a comunidade deixaria de o ser se os seus cidadãos não reconhecem igualmente deveres e responsabilidade para com aqueles que, de alguma forma – por causa da idade ou de doença, por exemplo – estejam incapacitados.
Não se supõe que a prática da cidadania, como a temos vindo a definir, seja “natural” para os indivíduos enquanto seres autónomos ou para quaisquer outros, no sentido em que conduz necessariamente as relações entre os concidadãos, para formas que conduzam à sobrevivência da comunidade. A forma de vida dos membros de uma comunidade política é altamente artificial. Não quer dizer que os cidadãos sejam maldosos, quer apenas dizer que ignoram, até ao momento em que se envolvem com os seus concidadãos na discussão política destas questões, as condições necessárias para manter essa forma de vida, bem como a conduta necessária para a extinguir.Todas estas discussões políticas identificam uma comunidade e autorizam uma forma de vida apropriada. A autoridade das regras e das normas de conduta, e dos propósitos substantivos da comunidade, derivam da avaliação pública dos seus cidadãos. E, uma vez que continuam a ser autónomos, está permanentemente aberto a reavaliação da qualidade das regras e das normas e dos propósitos que antes estabeleceram. […]»
É igualmente importante distinguir entre os laços que ligam os cidadãos uns aos outros e o altruísmo. Existe seguramente em muitas pessoas um reservatório de altruísmo que as leva a dar sangue, a participar em causas meritórias, ou a despender tempo, esforço e dinheiro em organizações de apoio aos mais desfavorecidos. Mas cidadania não é altruísmo: é o reconhecimento dos objectivos da comunidade como os nossos próprios objectivos, é participação na escolha destes e é o empenhamento na sua realização. O altruísmo é a resposta que um ser humano dá a outro. A cidadania é exclusiva: não é à humanidade de uma pessoa que se responde, mas ao facto de que ele ou ela é concidadão ou estrangeiro. Ao escolher uma identidade para nós, passamos a reconhecer quem pertence e quem não pertence à nossa comunidade política, mas também a reconhece aqueles que são inimigos potenciais. A cidadania corta com formas de universalismo religioso ou secular e envolve o reconhecimento, sempre que for necessário, daquilo que consideramos prioritário para a nossa comunidade política. Isto não implica a assunção de uma postura agressiva relativamente aos estrangeiros. Significa apenas que ser cidadão nem sempre implica tratar os outros como seres humanos. Mais uma vez, esta é uma ideia que reside no próprio coração da tradição do republicanismo cívico.
[…]
Não encontro palavra mais apropriada do que amizade para caracterizar as relações que devem existir entre os indivíduos para que uma comunidade possa funcionar. […] É a amizade, mais do que, por exemplo, a “virtude cívica” ou a “civilidade”, que se deve procurar para alcançar o que se pode chamar de comunidade, uma vez que é este tipo de laço entre os indivíduos que a cria. […] É a amizade que moraliza as acções dos indivíduos autónomos e que cria os cidadãos.
[…]
A sobrevivência de uma comunidade depende tanto da sua capacidade para se proteger, como da educação e do treino do mais novos. Os cidadãos têm deveres e responsabilidades nestas áreas, que passam a ser o próprio objecto do juízo político. Mais, a comunidade deixaria de o ser se os seus cidadãos não reconhecem igualmente deveres e responsabilidade para com aqueles que, de alguma forma – por causa da idade ou de doença, por exemplo – estejam incapacitados.
Não se supõe que a prática da cidadania, como a temos vindo a definir, seja “natural” para os indivíduos enquanto seres autónomos ou para quaisquer outros, no sentido em que conduz necessariamente as relações entre os concidadãos, para formas que conduzam à sobrevivência da comunidade. A forma de vida dos membros de uma comunidade política é altamente artificial. Não quer dizer que os cidadãos sejam maldosos, quer apenas dizer que ignoram, até ao momento em que se envolvem com os seus concidadãos na discussão política destas questões, as condições necessárias para manter essa forma de vida, bem como a conduta necessária para a extinguir.Todas estas discussões políticas identificam uma comunidade e autorizam uma forma de vida apropriada. A autoridade das regras e das normas de conduta, e dos propósitos substantivos da comunidade, derivam da avaliação pública dos seus cidadãos. E, uma vez que continuam a ser autónomos, está permanentemente aberto a reavaliação da qualidade das regras e das normas e dos propósitos que antes estabeleceram. […]»
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